“Ao desembarcar, Jesus viu uma grande multidão e compadeceu-se dela,
porque era como ovelhas que não têm pastor. E começou a ensinar-lhes muitas coisas.” (Mc 6, 34)
Meu amado, minha amada:
Estava eu lendo o Evangelho deste sábado, 07 de fevereiro (Mc 6, 30-34), quando me deparei com este último versículo. Fiquei pensando em várias situações por que passei nestes dias, sobretudo nas notícias que recebi – boas ou ruins. Lembrei das pessoas com quem encontrei, das inúmeras notícias de falecimentos, de doenças, de tragédias... E pensei também nas horas em que, não por falta de fé, mas por sobrecarga mesmo, acabo me perguntando: mas será que não vem uma notícia boa, só para variar? Acho que não estou fora do contexto, creio que você entende o que estou falando.
Então entendi uma coisa: não depende dos outros que a notícia boa chegue até mim. Depende, antes de mais nada, de mim. Mesmo cansada, arrasada, “acabada”, querendo um pouco de “sombra e água fresca” a sós com Jesus, muitas vezes (quase sempre) acabo mesmo é me deparando com “uma grande multidão”, “ovelhas que não têm pastor”. E aí, eu só tenho duas alternativas: ou saio correndo e me distancio ainda mais da possibilidade do Evangelho (literalmente, Evangelho significa "boa mensagem", "boa notícia" ou "boas-novas", derivando da palavra grega ευαγγέλιον, euangelion (eu, bom, -angelion, mensagem), ou eu fico ao lado de Cristo, ouvindo as boas notícias que somente Ele pode nos dar. Eu já fiz a minha escolha. E você? Seja qual for a sua decisão, sugiro que leia a bela meditação do Irmão Dominique a este respeito.
“‘Os apóstolos voltaram para junto de Jesus’ (Mc 6, 30a). Não é difícil imaginar o entusiasmo deles, pois acabavam de chegar de sua primeira missão, e tinham tantas coisas a partilhar, tantas perguntas a fazer... Jesus os acolhe e os convida a descansar num lugar afastado: ‘Vinde à parte, para algum lugar deserto, e descansai um pouco’ (Mc 6, 31a), lhes diz Jesus. A delicadeza fraterna que era vivida entre Jesus e seus discípulos não deixa de nos consolar. Como podemos imaginar que o Senhor seja, hoje, menos cuidadoso conosco do que Ele era com Seus Apóstolos, naquela época?
‘Partiram na barca para um lugar solitário, à parte’ (Mc 6, 32). É particularmente doce aos nossos ouvidos escutar que o Senhor não quer nos deixar permanentemente expostos, e nos concede a graça de um tempo de intimidade com Ele. Estar a sós com Ele na barca, rumar para um lugar deserto onde ninguém nos ‘roubará’ o Senhor, é uma perspectiva das mais felizes. É igualmente bastante provável que vivêssemos o convite de Jesus não somente como uma graça, mas também como uma recompensa e, certamente, como uma recompensa legítima – afinal, nossa vida não é tão difícil, tão cheia de esforços e sacrifícios para que permaneçamos fiéis ao Evangelho?
Em suma, Jesus nos convida ao descanso: algo maravilhoso e irrecusável!
Mas a concorrência é dura. Como demonstra o movimento da multidão, nós somos inúmeros a querer desfrutar da exclusividade do Senhor. Não temos os mesmos motivos, no mesmo momento: alguns buscam o repouso, porém outros têm fome da Sua Palavra; outros procuram n’Ele refúgio e apoio; outros correm para o Médico do corpo e da alma, cada um no seu ritmo, segundo sua história de vida. Em tais circunstâncias, subitamente parece impossível vivermos os momentos de paz que esperávamos.
De fato, impossível, pois eis que Jesus, ‘incorrigível’, se deixa apiedar pelo sofrimento e as necessidades de todos aqueles que a Ele acorrem. Então, nos diz o Evangelista Marcos, Ele ‘começou a ensinar-lhes muitas coisas’ (Mc 6, 34b).
Talvez este seja o ponto central, a grande questão da nossa meditação. A quem Jesus se pôs a ensinar? Somente à multidão? Ou a todos os que lá estavam, incluindo os Seus discípulos? Podemos suspeitar que Jesus não cumpra as Suas promessas? Se Ele diz aos Seus Apóstolos que Ele vai lhes dar repouso, será que Ele se esqueceu do que lhes disse poucos momentos antes?
Sem dúvida é preciso considerarmos que, mesmo que o ensinamento de Jesus à multidão não fosse diretamente destinado aos Apóstolos, era igualmente valioso para Seus discípulos. Era um modo de lhes ensinar que o descanso que devemos procurar, o único do qual realmente necessitamos, é aquele que experimentamos ao final do caminho de cura, que torna gratificante o resultado do longo caminho de retorno ao Pai. Nosso descanso é fazer a vontade de Deus. Ora, para experimentarmos a agitação interior causada por Sua Misericórdia tocada pela multidão, é preciso estarmos suficientemente despojados de nossas vontades próprias.
Assim, Jesus não pôde manter Sua promessa de partilhar um momento de intimidade com os Seus, afastados das multidões, mas Ele deu aos Apóstolos a chance de estarem não somente perto do Deus deles, mas NO Deus deles, permitindo-lhes abandonar suas vontades próprias e, assim, abraçarem a Sua, que é a de reunir as ovelhas perdidas.
‘Dá-nos, Senhor, sabermos entender Teus ensinamentos, abandonarmos nossas lógicas humanas e acolhermos a reconciliação e a missão que Tu nos ofereces; dá-nos sabermos estar abertos à Tua presença para escutarmos, a cada manhã, o convite que Tu nos fazes para entrarmos no Teu repouso.’”
Irmão Dominique, F.S.J. (Famille de Saint Joseph, França)
Tradução e Adaptação:
Gisele Pimentel
Nenhum comentário:
Postar um comentário