terça-feira, 5 de setembro de 2017

AS CASULAS DE MATISSE (Casulas e vestes Litúrgicas)

As casulas e vestes litúrgicas concebidas por Matisse estão expostas no Museu Matisse Cateau-Cambrésis.

Cada conjunto litúrgico é composto de vestes e acessórios da mesma cor, englobando uma casula, uma estola e um manípulo utilizados pelo padre. As maquetes foram realizadas por Matisse em papeis cortados pintados a guache.

As seis cores tradicionais utilizadas para os ornamentos sacerdotais mudam segundo os diferentes Tempos Litúrgicos do ano:

•A cor branca é usada nas grandes festas – Natal, Páscoa, Ascensão e festas da Virgem Maria.

Esta casula se destina às principais festas cristãs: Natal, Páscoa, Ascensão, Festas da Virgem, dos Santos não-mártires e Tempo Pascal. MATISSE cortou os padrões do primeiro estudo em papel amarelo-limão. Esta folhagem decorativa cria um efeito muito apurado e precioso de cor dourada sobre fundo branco. É um esboço inacabado, a primeira tentativa na qual MATISSE buscou a ligação entre a forma imposta, o padrão com cores precisas e sua destinação no espaço da igreja. O segundo estudo, que, como o primeiro, foi conservado por MATISSE1, sem contudo ser utilizado na casula, é uma muda de flores de quatro folhas. As flores são um tema recorrente nos desenhos e guaches de MATISSE e correspondem à tradição das casulas bordadas. O Padre COUTURIER havia lhe dito que não precisava respeitar uma iconografia. Para a maquete definitiva, aplicações amarelas e verdes evocam para a parte da frente uma planta com suas flores e frutos e, para as costas, um cálice e a Eucaristia. Algas floridas que lembram o vitral da Árvore da Vida, situado atrás do altar, decoram as laterais correspondentes aos movimentos dos braços do sacerdote. Esta casula será confeccionada em seda para a consagração da capela, em 25 de junho de 1951, e será a única a estar finalizada nesta data.

As casulas e acessórios foram confeccionados pelas Irmãs Dominicanas de Cépieux, próximo a Lyon, especialistas em vestimentas litúrgicas. O tecido escolhido era a popeline de seda com aspecto semelhante à matéria aveludada do guache. Todas as casulas foram revestidas de uma cor que desempenha um importante papel, pois esse revestimento é visível durante os ofícios. Com efeito a casula, mais larga que o comprimento dos braços do padre, é dobrada sobre os antebraços. A dobradura da casula branca é amarelo-pálido, a da verde e da vermelha é amarela mais atenuada que as padronagens. Um tom malva foi escolhido para a violeta, um branco-rosado para a casula rosa e um branco para a casula preta. Em 1996, as casulas e os acessórios foram reformados por iniciativa da Irmã JACQUES‐MARIE, religiosa Dominicana, amiga de MATISSE, que participou desde o início do projeto da Capela. As cores foram minuciosamente supervisionadas por Lydia DELECTORSKAYA, que verificava se estavam sendo respeitadas de acordo com as amostras cuidadosamente conservadas dos guaches originalmente recortados.

Todos que puderam ver as casulas no atelier de MATISSE ficaram apaixonados por estas que são vestimentas sacerdotais, mas que também fazem parte da criação têxtil que sempre foi uma paixão do pintor. Christian DIOR, numa visita a MATISSE para ver as maquetes das casulas, observou o quanto elas se aproximavam da alta costura. 


•A cor verde é usada nas celebrações do Tempo Comum.


•A cor violeta é usada durante os tempos do Advento e da Quaresma.


•A cor vermelha cor de fogo, do Amor divino é usada no Domingo de Ramos, no Pentecostes e nas festas dos Apóstolos e Mártires.

MATISSE escreveu embaixo de uma fotografia em preto e branco: “Casula vermelha, fundo vermelho-papoula. As partes claras são amarelo-limão”2. Pode-se acrescentar a estas explicações os comentários de Lydia DELECTORSKAYA3: “Enquanto ele a compunha (explicação textual de MATISSE), ele revia em seu espírito uma pequena ilha dos mares quentes, superaquecida pelo sol (daí o vermelho ardente da casula), uma ilha com vegetação seca (juncos e bambus amarelos), coberta de mosquitos (as pequenas cruzes pretas), características que tornam sua vida realmente insustentável, que martirizam.”4


•A cor rosa é usada duas vezes ao ano – nas festas de Gaudete (terceiro domingo do Advento) e de Laetare (terceiro domingo da Quaresma).


•A cor negra é usada em funerais, no Dia de Finados, podendo ser também usada na Sexta-Feira Santa.

MATISSE fez sete composições para a casula preta em papel cortado pintado a guache. Ela é utilizada na Missa de Finados, na Sexta-feira Santa – celebração da morte de Cristo -, e na encomendação de falecidos. Provavelmente ele realizou várias pesquisas, pois era apaixonado pelo equilíbrio das formas brancas sobre fundo preto por sua ligação com as cores do vitral – “superfície de luz e cor”. Esta problemática na base dos grandes desenhos murais pretos sobre fundo branco da capela, “uma parede cheia de desenhos em preto e branco”5, desta vez está invertida: trata-se de desenhos brancos sobre fundo preto, como nas linogravuras de Pasífae. Uma primeira maquete bem despojada contém apenas uma cruz inscrita num V e uma constelação de estrelas feitas com simples retângulos de papel superpostos. Em seguida, MATISSE faz três séries de casulas pretas, sempre com papéis cortados e pintados a guache branco. A primeira série tem por tema principal formas evocando espigas de trigo e letras da palavra “Esperlucat”, da qual ele tira o significado anotando uma reprodução fotográfica: “Preto – Composição nascida do desejo de fazer o trigo  e o encontro de uma palavra provençal que quer dizer descerrar – ver ou perceber –. Refletindo diante de uma casula mortuária, pode-se compreender que o modo mais seguro de se apresentar diante da morte é estar acompanhado por boas ações ( trigo). Esperlucat tirado dos dicionários de sinônimos Larousse6.” Pela morte, os olhos são descerrados. A morte é uma abertura para uma outra vida7. É também o que conta o Padre COUTURIER – “Falamos da casula preta: eu lhe disse que não é uma casula triste, mas uma casula de ressurreição. Ele me respondeu: ‘É o necessário, não é? A morte não é o fim de tudo, é uma porta que se abre”8.

MATISSE compõe uma outra maquete com motivos de algas e de peixes que dançam livremente sobre o fundo preto, dando a impressão de imensidão, onde anota: “Preto e branco. Asas, Palmas acompanham a cruz e os peixes”9. Enfim, as duas partes de maquete escolhidas para serem confeccionadas são decoradas com asas monumentais e dão uma sensação de poder. Seriam o símbolo da pomba do Espírito Santo ou do voo de uma alma após a morte? As letras cortadas de “Esperlucat” envolvem a cruz na frente da casula.


1. Collection Musée Matisse, Nice.
2. Ronchamp-Vence
3. Secrétaire et aide d’atelier.
4. Note manuscrite de Lydia Delectorskaya au sujet de la notice de l’oeuvre dans le catalogue de l’exposition de Washington, 
Matisse Paper CutOuts
5. H Matisse : Ecrits et propos sur l’art, p. 258
6. Ronchamp-Vence
7. Note de Lydia Delectorskaya
8. La chapelle de Vence, journal d’une création p.273
9. Ronchamp-Vence.


Tradução e Adaptação:

Gisèle Pimentel

http://chapellematisse.com/FR/chasubles.php