domingo, 28 de junho de 2009

Bento XVI: Ano para Renovação Interior dos Sacerdotes


Alocução no Angelus


CIDADE DO VATICANO, domingo, 28 de junho de 2009 (ZENIT.org).- Publicamos as palavras que o Papa proclamou ao rezar o Angelus juntos dos fiéis reunidos hoje ao meio-dia na praça de São Pedro, no Vaticano.


Queridos irmãos e irmãs!


Com a celebração das Primeiras Vésperas de São Pedro e São Paulo, que presidirei esta noite na Basílica de São Paulo Fora dos Muros, encerra o Ano Paulino, convocado no bimilenário do nascimento do apóstolo das gentes. Foi um tempo de graça em que, através de peregrinações, catequeses, numerosas publicações e várias iniciativas, a figura de São Paulo foi proposta em toda a Igreja e sua vibrante mensagem fez reviver, especialmente nas comunidades cristãs, o amor por Cristo e o Evangelho. Rendamos graças, portanto, a Deus pelo Ano Paulino e todos os dons espirituais que nos trouxe.


A Divina Providência assegurou que há poucos dias, a 19 de junho, Solenidade do Sagrado Coração de Jesus, fosse inaugurado outro ano especial, o Ano Sacerdotal, com ocasião do 150º aniversário da morte –dies natalis– de São João Maria Vianney, o Santo Cura d'Ars. Um novo impulso pastoral e espiritual que –estou certo– trará muitos benefícios para o povo e, sobretudo, para o clero. Qual é a finalidade do Ano Sacerdotal? Como escrevi na carta que enviei aos sacerdotes, visa a ajudar a promover os esforços de renovação interior de todos os sacerdotes para o seu mais poderoso e eficaz testemunho do Evangelho no mundo de hoje. O apóstolo Paulo é, neste aspecto, um modelo maravilhoso a imitar não tanto na realidade da vida –pelo fato de que era realmente extraordinária– mas no amor a Cristo, no zelo com a proclamação do Evangelho, na dedicação à comunidade, na elaboração de uma eficaz síntese de teologia pastoral. São Paulo é exemplo de sacerdote totalmente identificado com o seu ministério –como também o Santo Cura d'Ars–, consciente de portar um tesouro inestimável, que é a mensagem da salvação, mas de trazê-lo em "vasos de barro" (cf. 2 Cor 4, 7); então, ele é forte e humilde ao mesmo tempo, intimamente convencido de que tudo é mérito de Deus, tudo é a sua graça. "O amor de Cristo nos constrange" –escreve o apóstolo, e este pode muito bem ser o lema de cada sacerdote, que o Espírito "aproxima" (cf. Atos 20, 22) para fazer um fiel administrador dos mistérios de Deus (cf. 1 Cor 4,1-2): o sacerdote deve ser todo de Cristo e todo da Igreja, à qual é chamado a se dedicar com amor incondicional, como um marido fiel a sua esposa.


Caros amigos, em conjunto com os apóstolos Pedro e Paulo, invoquemos a intercessão da Virgem Maria, para obter do Senhor bênçãos abundantes durante este Ano Sacerdotal que começa. Maria, que São João Maria Vianney tanto amou e fez amar os seus paroquianos, ajude cada padre a reviver o dom de Deus que está nele por força da santa Ordenação, para que eles cresçam em santidade e estejam prontos para testemunhar, se necessário até o martírio, a beleza de sua total e definitiva consagração a Cristo e à Igreja.


(Traduzido por Zenit - ZP09062805 - 28-06-2009)



Fontes:


http://www.zenit.org/article-21999?l=portuguese


http://www.diocese-lgf.ch/sacerdoce.jpg

terça-feira, 23 de junho de 2009

Angelus Silesius - Tomo I

Johannes Scheffler (1624 - 9 julho de 1677), mais conhecido pelo nome de Angelus Silesius, com o qual ele publicou suas obras, é um poeta religioso alemão de influência mística.

Biografia

Johannes Scheffler nasceu em Breslau, na Silésia, em 1624. Inicialmente luterano, ele se converteu ao catolicismo em 1652.

Sua obra principal e mais polêmica é a Convicção moral motivada ou demonstração segundo a qual poderia-se e deveria-se levar os hereges à verdadeira fé (publicada em 1673). Muito influenciado pelos místicos alemães e holandeses da Idade Média, notadamente por Maître Eckhart, Henri Suso, Jean Tauler, et Ruysbroeck, ele escreveu inúmeros poemas que foram compilados em duas obras, ambas lançadas em 1657:

  • O peregrino querubínico (Cherubinischer Wandersmann), editada pela segunda vez em 1675, constituída de 1676 dísticos e 10 sonetos;
  • Santas delícias da alma ou Éclogas espirituais de Psyché enamorada de seu Jesus (coletânea de Lieder).

Muito lido pelos poetas e filósofos de cultura alemã desde o Século XIX, sua influência póstuma se estende sobre a poesia de Rilke, sobre a filosofia de Schopenhauer et Heidegger. Os dois versos abaixo estão no centro do pensamento heideggeriano:

"A rosa não tem porquê, ela floresce porque floresce.

Não cuida de si mesma, - nem pergunta: eu sou notada?"

— C.W., I, 289


Alguns aforismos da obra "O peregrino querubínico"

(a.fo.ris.mo) sm.

1. Breve sentença que contém uma regra, uma mensagem, um princípio de grande alcance ou um conceito moral; máxima: "Tudo parece mais verdadeiro quando escrito sob forma de aforismo." (Wolfgang Goethe, Máximas e reflexões)

2. Dito sentencioso; APOTEGMA

[F.: Do lat. aphorismus; der. gr. aphorismos. Cf.: aforisma.]

Livro I

Aqui deve ser o começo.

Se quiseres estar eternamente com o cordeiro de Deus

Deves desde aqui seguir as Suas pegadas. (Af. 155)

Deus tem sede. Dá-Lhe de beber!

Deus Se queixa de sede e tu sempre O fazes sofrer,

Se não O sacias como aquela mulher samaritana! (Af. 160)

Deves ter a relação filial.

Se quiseres chamar o Deus Altíssimo de Pai,

Deves primeiro reconhecer que és Seu filho. (Af. 162)

Deve-se amar a humanidade.

É justo e bom que não ames os homens:

É a humanidade no homem que devemos amar. (Af. 163)

Cristo é tudo!

Maravilha! Cristo é verdade e Palavra, luz e vida,

Alimento e bebida, caminho e peregrino, porta e lugar. (Af. 168)

O homem não vive só de pão.

O pão não te alimenta: o que no pão sacia

É a eterna Palavra de Deus, é vida e espírito. (Af. 173)

Um cristão é Igreja e tudo o mais.

Mas o que sou, afinal? Devo ser a igreja e a pedra,

Ser o sacerdote de Deus e também a vítima. (Af. 180)

O mercenário não é filho.

Se serves a Deus por bens, santidade e recompensa,

Ainda não O serves por amor, como filho. (Af. 182)

O que és diante de Deus?

Homem, não te creias importante para Deus por tuas obras!

Para Deus a ação de todos os santos não passa de brinquedo. (Af. 194)

A luz é feita de fogo.

A luz dá força a tudo: o próprio Deus nela vive!

Se Deus não fosse fogo, a luz logo morreria. (Af. 195)

Arca espiritual e vaso do maná.

Se o teu coração é de ouro e a alma pura,

Podes também ser arca e vaso do maná. (Af. 196)

O Verbo é como o fogo.

O fogo move todas as coisas mas não é movido:

Assim o Verbo eterno, que a tudo inicia e move. (Af. 198)

Por que Deus nasce?

Mistério insondável! Deus perdeu a si mesmo:

Por isso quer ser re-nascido em mim. (Af. 201)

A alta dignidade.

Oh, alta dignidade! Deus desce de Seu trono

E me põe em Seu lugar como Seu amado Filho. (Af. 202)

O homem é a coisa mais elevada.

Nada me parece elevado: a suprema coisa sou eu,

Pois até Deus, sem mim, é pouca coisa para Si. (Af. 204)

Como se chama o homem novo?

Se queres conhecer o homem novo e seu nome,

Pergunta antes a Deus como Ele costuma Se chamar. (Af. 206)

O mais belo festim.

Oh, suave banquete! O próprio Deus será o vinho,

Mesa, música e alimento, que Ele próprio servirá. (Af. 207)

A feliz intemperança.

Demasiado nunca é bom. Detesto o excesso!

Mas de Deus quero estar pleno, como Jesus. (Af. 208)

Mais nos abandonamos, mais somos como Deus.

Os santos tanto mais se embriagam pela divindade de Deus

Quanto mais n'Ele se perdem e se afundam. (Af. 210)

Também eu à direita de Deus.

Porque meu Salvador assumiu a natureza humana

Também eu cheguei, por Ele, à direita de Deus. (Af. 220)

A fé.

Como grão de mostarda, a fé transporta o monte para o mar;

Pensai o que ela faria se fosse uma abóbora! (Af. 221)

A confiança.

Ter confiança é bom, e bela é a fé;

Se não és justo, porém, terás apenas aflição. (Af. 223)

Bibliografia

  • Le Pèlerin chérubinique (O peregrino querubínico), trad. Camille Jordens, Le Cerf, Paris, 1994 (ISBN 2204048941);
  • Le Voyageur chérubinique ou épigrammes et maximes spirituelles pour conduire à la contemplation de Dieu (O Viajante querubínico ou epigramas e máximas espirituais para conduzir à contemplação de Deus), trad. Maël Renouard, Rivages, Paris, 2004;
  • La rose est sans pourquoi (A rosa não tem porquê), Albin Michel, 2003 (ISBN 2226137378).

(Caligrafias de Vincent Geneslay.)


Fonte:

O peregrino querubínico,trad. Ivo Storniolo, Paulus,São Paulo, 1996 (ISBN 85-349-0553-3)

http://www.riodedeus.com/orando02.html


Traduzido por Gisele Pimentel



domingo, 14 de junho de 2009

Santa Germana Cousin - A história da "santa sem história" - 15 de Junho


Santa Germana Cousin (para colorir)

Há tão poucos dados sobre a vida de Santa Germana Cousin, que ela foi chamada "a santa sem história". Pois, como vimos, ela passou a ser mais conhecida depois de sua morte do que em vida.

Foi ali mesmo, em Pibrac, que Germana nasceu presumivelmente em 1579. Seu pai, Lourenço Cousin, era, segundo alguns, um homem de posses que chegara a ser duas vezes prefeito do lugar1; segundo outros, um agricultor quase indigente2. Casado com Maria Laroche, mulher piedosa e de saúde frágil, tiveram quase na velhice uma filha doentia, aleijada da mão direita e atacada de escrófula. Órfã muito cedo, Germana foi afastada do convívio familiar, sendo transferida para o estábulo da casa, pelo medo de que sua doença se transmitisse às outras crianças do lar. Logo que ela cresceu um pouco, foi incumbida de cuidar do rebanho pertencente à sua família.

Teria Germana crescido revoltada contra tudo e contra todos, principalmente contra Deus, que a fizera nascer em condições tão humilhantes? Não. Na escola da humilhação e do sofrimento, elevou seu espírito para Deus, aceitando amorosamente o triste quinhão que lhe fora reservado. Triste quinhão aos olhos do mundo, mas, aos olhos d'Aquele que entregou seu Filho Unigênito à morte, e morte de cruz, esse quinhão só é reservado para os eleitos que compreendem o valor incalculável do sofrimento.

François Veuillot, em sua biografia da Santa, refere-se a duas pessoas que a ajudaram muito a compreender sua situação e a servir-se dela para a própria santificação: uma antiga empregada da família, que dedicou à orfãzinha um verdadeiro amor materno, ensinando-lhe os rudimentos de Religião, e o velho pároco de Pibrac, homem virtuoso e com zelo apostólico, que via naquela criança cândida e inocente uma predileta do Céu.

Milagres: sinais da predileção divina

A humilde pastorinha tornou-se, a seu tempo, apóstola. E às outras crianças ensinava o catecismo que aprendera e o que lhe transmitia o Divino Espírito Santo com os seus dons. Embora vivesse apenas de pão e água, achava um meio de repartir seu alimento com outros ainda mais destituídos de bens terrenos.

Os contemporâneos guardaram na memória três milagres que ocorreram com Germana. Um deles foi a repetição de um outro ocorrido séculos antes com uma rainha santa: tendo recolhido na mesa, após a refeição familiar, as migalhas e restos que sobravam, para dar aos pobres, Germana colocou tudo em seu avental, e já saía para socorrer seus protegidos quando foi percebida pela madrasta. Esta, munida de uma vara, correu atrás de Germana, chamando-a em altos brados de ladra e de outros nomes que sua ira e mau gênio lhe sugeriam. Alguns vizinhos acorreram, providencialmente, e foram testemunhas do milagre. A adolescente abriu seu avental e dele caíram flores perfumadas e frescas, como não havia na região.

Devotíssima da Santa Missa, que naquele tempo se celebrava com toda seriedade e devoção, Germana acorria à igreja ao primeiro toque do sino. Mas para isso era preciso muitas vezes deixar seu rebanho. Confiada na Providência Divina, espetava seu bastão de pastora no chão e ordenava às ovelhas que dele não se afastassem enquanto ela estivesse ausente. E nunca sumiu um só animal, apesar de haver muitos lobos numa floresta vizinha.

Para ir à igreja, Germana atravessava um riacho, saltando de pedra em pedra. Durante as chuvas ou o degelo, o riacho crescia muito de volume, tornando-se impossível atravessá-lo a pé. Mas não a Germana. Ela parecia nem perceber a dificuldade. Recolhida como ia, simplesmente nele entrava sem preocupação. E essas águas — como outrora as do Mar Vermelho, à voz de Moisés fugindo do Faraó — separavam-se, deixando-a passar a pé enxuto.

Uma noite do ano de 1601, três viajantes contaram ter visto uma luz no céu, e um branco cortejo de Anjos que desciam até uma casa de Pibrac, e depois subiam transportando a alma de uma jovem igualmente vestida de luz e coroada de flores.

Chegando ao povoado, constataram que havia morrido durante o sono, na casa dos Cousin, a jovem Germana. Seu corpo foi sepultado na igreja, e sua memória caiu no olvido dos anos até a nova intervenção da Providência Divina, em 1644, como vimos.

Emocionante pós-história de Santa Germana

O vigário de Pibrac, para evitar a veneração pública de uma pessoa ainda não canonizada, colocou na sacristia a urna contendo os restos mortais de Germana. Dezesseis anos mais tarde o Vigário Geral da Arquidiocese de Toulouse, Padre Jean Dufour, fazendo a visita pastoral em nome do arcebispo, viu aquela urna funerária na sacristia e estranhou. Contaram-lhe então sua história, e quis ele ver o corpo, tendo constatado estar inteiramente incorrupto, como por ocasião de sua descoberta. O vigário mostrou-lhe um registro onde estavam relatadas inúmeras curas miraculosas atribuídas a Germana. Esse foi o início do processo diocesano que levaria, quase 200 anos depois, à beatificação e canonização da humilde pastora.

Mas antes seria ela objeto de uma profanação e de um novo milagre retumbante, por ocasião do Terror, em 1793, durante a sinistra Revolução Francesa. Três revolucionários de Toulouse, querendo acabar com aquela "superstição", acompanhados de três pessoas locais, violaram a urna, dela retiraram o corpo ainda incorrupto de Germana — tão endurecidos estavam, que nem à vista desse milagre se comoveram — e o enterraram na própria sacristia, coberto com uma camada de cal viva.

Os três revolucionários de Toulouse foram atacados por humilhantes e dolorosas deformações. Dois deles arrependeram-se e pediram o auxílio da Santa, tendo sido curados. O terceiro levou a moléstia até o fim de sua vida. Não sabemos o que aconteceu com seus três acompanhantes de Pibrac.

Dois anos depois, em 1795, foi possível desenterrar novamente o corpo. Se bem que a carne tivesse sido devorada pela cal, esta respeitou milagrosamente toda a ossatura, que normalmente deveria ter igualmente desaparecido.

Depois da canonização de Germana, em 1854, o povo de Toulouse quis perpetuar sua memória num monumento de 17 metros de altura, no qual, no alto de uma pirâmide, aparecia Germana em oração, tendo um cordeiro a seus pés.

Isso não durou muito. Em 1881, a nova municipalidade de Toulouse, dominada pela Maçonaria, fez demolir o monumento, relegando a imagem da santa ao subsolo de um museu. Houve reação popular. Finalmente a imagem rejeitada foi solenemente instalada no altar de uma igreja construída em honra da Santa, num bairro popular de Toulouse.

Uma basílica também foi erigida em Pibrac, ao lado da velha igrejinha na qual recebera as águas regeneradoras do Batismo aquela que foi, e ainda é, a mais ilustre filha da cidade.

Notas:

1.Cfr. François Veuillot, Sainte Germaine Cousin _ Fille de Ferme, P. Lethielleux, Paris, 1941, p. 10.

2.Cfr. Les Petits Boullandistes, Vies des Saints, d'aprés le Père Giry, Bloud et Barral, Paris, 1882, tomo VII, p. 43.

Outras Obras consultadas:

C. Saint Germaine Cousin, Mulcahy, Transcribed by Elizabeth T. Knuth, The Catholic Encyclopedia, Volume VI, Copyright © 1909 by Robert Appleton Company, Online Edition Copyright © 1999 by Kevin Knight.

Germaine Cousin, Site de Catholic Community Forum, Online Edition.

Sainte Germaine Cousin, Site da Prefeitura de Pibrac, na Internet.


Fontes:

http://www.catolicismo.com.br/materia/materia.cfm?IDmat=252&mes=junho2002&pag=2

http://www.wf-f.org/WFFResource/GermaineCousin2.jpg

sábado, 13 de junho de 2009

14 de Junho, Festa de Santo Eliseu, Profeta



Profetas Eliseu e Elias


Na Bíblia

O ciclo de Eliseu (2Rs 2-9.13,1-10) está ligado com o de Elias. A vocação de Eliseu está colocada após a teofania do Horeb (1Rs 19,16-21). Segundo a ordem divina, ele é aquele que deve suceder ao Tesbita. Por isso torna-se seu servidor e discípulo (2Rs 2,1-18). Pelo fato de acompanhar e ser testemunha do rapto de Elias, Eliseu herda o duplo espírito do Tesbita (2Rs 2,1-18). O carro e os cavalos que raptaram Elias constituem a escolta invisível de Eliseu (2Rs 6,17). Numerosos milagres e prodígios exaltam “o homem de Deus”, o taumaturgo a serviço dos pobres e que intervém na política. Morto, o seu cadáver ressuscita um morto (2Rs 13,20-21). No livro do Eclesiástico, o seu elogio segue o do seu mestre (Eclo 48,12-14) e recorda o dom do espírito de Elias que recebeu durante o rapto. Entre as suas obras maravilhosas é indicada a ressurreição de um morto após a sua morte. A cura de Naamã, o Sírio, é recordada no Evangelho (Lc 4,27), também depois de recordar Elias.

Por duas vezes a Bíblia menciona a estada de Eliseu no Monte Carmelo: para lá ele se retira após o episódio dos meninos devorados pelos ursos (2Rs 2,25) e ali a sunamita vai encontrá-lo para suplicar-lhe que devolva a vida ao seu filho (2Rs 4,25). Uma gruta com dois patamares era considerada como a “casa de Eliseu”, aquela onde ele recebeu a visita da sunamita. Ali foi construída uma laura (cenóbio) bizantina conhecida como Mosteiro de Santo Eliseu.

Nascimento de Eliseu

O provincial carmelita da Catalunha, Felipe Ribot (+ 1392), recorda o prodígio que acompanhou o nascimento de Eliseu, assim como foi contado por Isidoro de Sevilha e Pedro Comestor: “Ao nascimento de Eliseu, um dos novilhos de ouro adorados pelos filhos de Israel mugiu atravessando o jardim de Eliseu. Um sacerdote do Senhor o escutou em Jerusalém e, inspirado por Deus, proclamou: ‘nasceu em Israel um profeta que destruirá todos os ídolos esculpidos e fundidos”. Só João de Hornby, carmelita inglês do século XIV, indica que Eliseu era descendente de Arão, como Elias, enquanto que a Vitae Prophetarum e Isidoro mencionam “a tribo de Rubem”.

Eliseu, figura de Cristo

Como Elias, Eliseu é apresentado pelos Padres da Igreja como figura de Cristo enquanto taumaturgo. Já Orígenes chamava Cristo “o Eliseu espiritual que purifica no mistério batismal os homens cobertos pela sujeira da lepra” (Hom. sobre Lucas 33,5). Eliseu estendendo-se sobre o menino anuncia a Encarnação de Cristo que se faz pequeno para salvar-nos. O vaso novo lançado com sal na água (episódio amplamente desenvolvido pelos Padres Latinos), o sal que purifica as águas, o machado recuperado, são figuras de Cristo. Multiplicando os pães de cevada para cem pessoas, iluminando os olhos do seu servo e cegando os de seus inimigos, curando Naamã com o banho no rio Jordão, Eliseu é ainda figura do Messias. A ressurreição de um morto ao contato com os seus ossos prefigura da descida de Cristo aos infernos para dar vida aos mortos. No sermão 128 de Cesário, a viúva libertada da sua indigência, graças ao milagre operado por Eliseu, prefigura a Igreja libertada do pecado à vinda do Salvador; a sunamita estéril, que concebe pela oração de Eliseu, é também figura da Igreja estéril antes da vinda de Cristo. Igualmente João Baconthorp (+ 1348) faz o paralelo entre os milagres de Elias e de Eliseu com os de Jesus (Speculum 2).

Eliseu, modelo do monge

Numerosos Padres da Igreja atestam a virgindade de Eliseu seguindo a de Elias. Para São Jerônimo “na Lei antiga, a fecundidade era objeto de bênção. Mas pouco a pouco, à medida em que a messe se torna mais abundante, foi enviado um ceifador: Elias que foi virgem. Eliseu também o foi, como do mesmo modo os filhos dos profetas” (Ep. 22). Os carmelitas medievais reproduziram estas linhas insistindo sobre o fato que Elias e Eliseu foram os primeiros a consagrarem-se a Deus na virgindade. Pe. Daniel da Virgem (+ 1678) explica que o celibato honra e imita por antecipação a Virgem Maria: “Eliseu conheceu antecipadamente e imitou a pureza da Virgem Mãe de Deus” (Vida de Santo Eliseu, pref.).

A oração tem um papel primordial na vida de Eliseu: é a fonte dos milagres que o Senhor faz através dele. No texto bíblico, isto é expresso explicitamente através da ressurreição do filho da sunamita, por isto o Senhor abre os olhos do seu servo para cegar os arameus. Os Padres da Igreja acentuam ainda mais o papel da oração: ele obtém um filho para a sunamita, faz submergir o machado caído na água do rio Jordão. Assim através de Eliseu os carmelitas fazem jorrar o seu apostolado pelo colóquio com Deus.

A renúncia inicial de Eliseu, que sacrifica os bois e o arado antes de seguir Elias, é um exemplo de exortação para se afastar das preocupações mundanas (Jerônimo, Ep. 71,3). A recusa dos presentes de Naamã fornece aos Padres um belo exemplo de afastamento dos bens. Para Cassiano, Eliseu é um dos fundadores do monaquismo e, de modo especial, um mestre da pobreza (Inst. 7, 14,2).

Amona (século IV), discípulo de Antonio o Grande, canta todos aqueles que obedeceram aos seus pais, cumprindo a sua vontade com a obediência perfeita em tudo. Eliseu é um dele (Ep. 18). Isaías de Scete (+ 491) exorta à obediência com o exemplo de Eliseu (Asceticon 7). A homilia bizantina mais freqüentemente indicada para a festa de Santo Elias é um comentário sobre o Profeta Elias, o Tesbita, atribuída a São João Damasceno, sem dúvida provém do ambiente monástico. A menção de Eliseu põe em relevo a sua ligação total a Elias:“Tendo deixado tudo, casa, campos, bois, ele o segue, servindo-lhe em tudo e totalmente ligado à sua pessoa. Elias, que viveu dali em diante com Eliseu a quem havia também consagrado profeta segundo um oráculo divino, estava dia após dias reunido com ele sob o mesmo teto, compartilhando o mesmo estilo de vida, absolutamente inseparáveis”.

Atanásio de Alexandria, na vida de Antão, mostra que Eliseu via Giezi distante e as forças que o protegiam porque o seu coração era puro, escopo de toda ascensão monástica. João Baconthorp considera em Eliseu o carmelita aplicado à contemplação que “vê” Deus, destinado a trazer no seu coração a chama ardente e irradiante e a palavra de vida, como Maria, e a imitação de Elias e de Eliseu que viveram a vida contemplativa no Carmelo (Laus 2,2). Pe. Daniel da Virgem na sua Vida do Santo Profeta Eliseu reassume os papéis respectivos de Elias e de Eliseu: “Inaugurando a vida religiosa, monástica e eremita, Elias a plantou, Eliseu depois a irriga e grandemente a divulga”.

Eliseu, discípulo de Elias

Nas Antiguidades Judaicas de Flávio Josefo e em numerosos escritos patrísticos seja do Oriente como do Ocidente, Eliseu está constantemente presente como discípulo de Elias, seu filho espiritual, seu herdeiro. Jacques de Saroug (449-521), autor de sete discursos em métrica que representam longamente a figura de Eliseu e a sua mensagem, utiliza diversos epítetos. Igualmente Máximo de Torino (+ 408/423), de quem duas homilias se referem a Eliseu: “Porque se admirar que os anjos, que levaram o mestre, levam o discípulo (...)? De fato ele mesmo é o filho espiritual de Elias, herdeiro da sua santidade” (Sermão 84). Os Diálogosdo Papa Gregório Magno muitas fazem eco às façanhas de Eliseu. Se a “rubrica prima” das Constituições de 1289 se contenta de justapor Elias e Eliseu, João de Cheminot, depois João de Venette especificam que Eliseu é“discípulo” de Elias. Porém as Constituições de 1357 foram assim modificadas: “A partir do Profeta Elias e de Eliseu, seu discípulo”.

Eliseu, o discípulo por excelência

Eliseu não é discípulo de Elias somente. Seguindo a tradição hebraica que se encontra nas Vitae prophetarum, na introdução de São Jerônimo em seu Comentário ao livro de Jonas e algum outro escrito patrístico, Jonas seria o filho da viúva de Sarepta, ressuscitado pelo profeta e que se tornou discípulo de Elias: “Jonas, depois da sua morte, foi ressuscitado pelo profeta Elias: o seguiu, sofreu com ele e, por sua obediência ao profeta, mereceu receber do dom da profecia” (Sinassário árabe jacobita de 22 de setembro). João Baconthorp conhecia esta tradição que provém de São Jerônimo. João de Cheminot, seguindo Felipe Ribot, indica como primeiro discípulo o servo que Elias deixou em Bersabéia, quando fugia de Jesabel (1Rs 19, 3). Este servo é aquele que Elias enviou ao cume do Monte Carmelo para observar a chegada da chuva (1Rs 18, 43).

Segundo as Vitae prophetarum, Abdias, o intendente de Acab que escondeu os cem profetas em grupos de cinqüenta, enviado por Acazias, (1Rs 18, 3-4) tornou-se discípulo de Elias. Teodoro Bar-Koni, autor nestoriano do século VIII, especifica que ele recebeu o dom da profecia após ter seguido Elias. Os carmelitas medievais enumeram Abdias entre os grandes discípulos de Elias.

Felipe Ribot é o único carmelita do século XIV a mencionar o profeta Miquéias como discípulo de Elias.

Para Cheminot e Ribot, Eliseu ocupa o primeiro lugar no grupo dos discípulos do Profeta Elias.

O duplo espírito de Elias

Eliseu é o sucessor de Elias que recebeu o seu duplo espírito, quando viu seu rapto (2Rs 2, 9-13). De acordo com uma tradição hebraica, Eliseu realizou 16 milagres, enquanto que Elias havia feito 8. A partir do século XII, Ruperto de Deutz fez o mesmo cálculo (A Vitória do Verbo de Deus). Para São Jerônimo, o duplo espírito se manifesta com os milagres maiores. Para Felipe Ribot, o duplo espírito é o dom da profecia que consente prever o futuro e o dom dos milagres: «Eis porque lhe dá a direção do magistério espiritual de todos os religiosos que tinha instituído. Como sinal disto, ele deu a Eliseu o seu hábito como sinal distintivo do seu instituto, deixando-lhe o seu manto, quando foi levado ao céu» (nº 149). A partir do século XVI, outros – como Pedro da Mãe de Deus, carmelita descalço holandês – vêem no duplo espírito o espírito da contemplação e da ação: «Os discípulos do Carmelo (...) estão obrigados por vocação a pedir sempre a Deus o duplo espírito de Elias (...), isto é, o espírito de oração e de ação, o verdadeiro espírito do Carmelo» (As Flores do Carmelo).

Santa Teresa de Ávila evoca juntos Elias e Eliseu numa poesia: «Seguindo o Pai Elias, nós combatemos a nós mesmas, com a sua coragem e o seu zelo, ó Monjas do Carmelo. Após ter renunciado a nosso prazer, busquemos o forte Espírito de Eliseu, ó Monjas do Carmelo» (Caminho para o céu). Notemos que na sua correspondência ou nas Relações, Santa Teresa designa frequentemente com o nome de Eliseu o seu caro filho, Padre Jerônimo Gracián.

Em Lisieux, Santa Teresa do Menino Jesus, que morava na cela Santo Eliseu do dormitório Santo Elias, muito naturalmente alude ao duplo do espírito: «Recordando-me da oração de Eliseu ao seu pai Elias, quando ele ousou pedir-lhe o dobro do seu espírito, me apresentei diante dos Anjos e dos santos, e lhe disse (...) ouso pedir-lhes que me concedam o dobro do vosso amor» (Ms B 4r).

Prior dos filhos dos profetas

O apologista São Justino se refere ao episódio do ferro do machado caído na água que Eliseu fez boiar com um pedaço de madeira (2Rs 6, 1-7). Onde o texto bíblico diz simplesmente que os filhos dos profetas queriam construir um lugar de moradia, Justino precisa que estes estavam cortando a madeira destinada pra construir «a casa para aqueles que queriam repetir e meditar a lei e os preceitos de Deus» (Diálogo com Trifão, 86). Esta paráfrase se tornará no século XIII o coração da Regra dos carmelitas que se consideram os sucessores dos filhos dos profetas para «meditar dia e noite na lei do Senhor».

Gerado à vida pelo Espírito de Elias, Eliseu pode por sua vez gerar filhos, chamados na Bíblia de «filhos dos profetas». Teodoreto de Ciro apresenta Eliseu à testa do «coro» dos profetas que o consideravam como«prior» deles (Quaest 4 Re 6, 19).

Felipe Ribot mostra como Eliseu é reconhecido «pai» dos filhos dos profetas: «Vendo Eliseu revestido do hábito de Elias, reconheciam que estava repleto do espírito de Elias e o receberam imediatamente como pai deles e mestre no lugar de Elias» (nº 149). Ele ensina aos filhos dos profetas, dá a eles ordens, organiza a comunidade religiosa instituída por Elias. Igualmente para João Soreth, após a ascensão de Elias, os filhos dos profetas «o veneraram, como superior deles, porque substituía Elias no governo dos eremitas».

Os caçoadores de Eliseu

Segundo a Haggadah, os caçoadores de Eliseu não são meninos, mas adultos que se comportam como meninos tolos. O número de pessoas devoradas pelos dois ursos corresponde então aos 42 sacrifícios ofertados por Balac (Nm 23). Os Padres Latinos não se referiram a esta tradição e dão uma interpretação anti-hebraica: Vespasiano e Tito – os dois ursos – aniquilaram Jerusalém 42 anos após a Paixão de Cristo, escarnecido pelos hebreus. Por outro lado o grito «sobe, careca» é um insulto a Elias para transformar em chacota o seu rapto. João Baconthorp pensa nos detratores da Ordem: Eliseu ensina o respeito devido à antiguidade da Ordem como para cada forma de velhice (Laus 2, 1).

A sepultura de Eliseu

Um tradição hebraica tardia, bem atestada na Patrística (Jerônimo, Egéria, Anônimo de Piacenza, Isidoro de Sevilha, Beda o Venerável), localiza a tumba de Eliseu em Sebaste na Samaria, com as tumbas de Abdias e de João Batista. Os carmelitas da Idade Média (João de Cheminot, Speculum 1; João de Hildesheim, Diálogo) conheciam esta tradição. A sepultura de Eliseu foi violada por Juliano o Apóstata no século IV. Parte dos ossos foi transferida para Alexandria e para Constantinopla, e dali para Ravenna em 718 e colocada na igreja de São Lourenço. No Capítulo Geral de 1369, autorizou-se a Ordem a fazer investimento econômico para obter as relíquias de Eliseu. A igreja foi destruída em 1603 e se ignora a sorte das relíquias, entretanto se mostra na igreja de Santo Apolinário a cabeça de Santo Eliseu.

Culto litúrgico

O primeiro decreto oficial aprovando a festa de Santo Eliseu para o dia 14 de junho, data na qual o profeta é festejado no rito bizantino, se encontra nas Constituições de 1369. Foi promulgada no Capítulo Geral de Florença de 1399. Em 1564 se adicionou uma oitava à celebração da festa. No calendário da Reforma Teresiana, em 1609, a memória de Eliseu recebe a categoria de festa de primeira classe, mas em 1617 foi reduzida à condição de segunda classe, com oitava, e depois abandonada em 1909. As Constituições O. Carm. de 1971 determinavam: “Com oportuna solenidade sejam celebradas as festas dos pais da Ordem Elias e Eliseu, do protetor S. José e dos nossos santos” (nº 72). Mas na reforma litúrgica de 1972, Eliseu foi excluído do calendário dos dois ramos do Carmelo. Por solicitação dos Carmelitas da Antiga Observância, a reintrodução da memória de Santo Eliseu foi aceita pela Sagrada Congregação do Culto Divino e da Disciplina dos Sacramentos em 1992.

Conclusão

Elias e Eliseu são considerados o ponto de partida de uma sucessão ininterrupta de monges no Antigo Testamento e depois no Novo Testamento, antes de serem mais simplesmente os inspiradores dos Carmelitas dos quais estes querem ser seus imitadores e ainda mais seus filhos. A devoção ao profeta Eliseu conheceu um eclipse de uns 30 anos após o Concílio Vaticano II: a reforma litúrgica do Próprio do Carmelo não conservou a sua festa, as Constituições O. Carm. (1971) e as dos Carmelitas Descalços (1991) nomeiam o profeta Elias somente quando se referem à tradição bíblica da Ordem. Por sorte, diversos estudos o recolocaram no seu lugar (Carmel 1994/1). As Constituições O. Carm. de 1995 dizem: “O Carmelo celebra, com especial devoção, os seus Santos, colhendo neles a expressão mais viva e genuína do carisma e da espiritualidade da Ordem ao longo dos séculos. Com particular solenidade, sejam celebradas a festividade de Santo Elias Profeta,a memória de Santo Eliseu Profeta e as festas dos protectores da Ordem, a saber, S. José, S. Joaquim e Santa Ana” (nº 88).

De fato o Carmelo reconhece como seus inspiradores, não só o Tesbita, mas juntos Elias e Eliseu, porque nesta mesma relação se manifesta o carisma do Carmelo.



Fontes:

http://br.geocities.com/wilmarsantin/Eliseu.htm


http://www.ceramicanorio.com/valeapenaconhecer/santeirosdobrasilparte4/1845_700.jpg